Itajubá e São Lourenço. Bolas de basquete nas mãos, uniformes vermelhos da Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi), felicidade estampada nos rostos. De cabeças erguidas, sem algemas e de pés descalços na fria Itajubá, no Sul de Minas, os detentos vivem um Sonho de Liberdade, projeto de ressocialização liderado pelo ex-jogador André Brazolin, que ensina o esporte dentro e fora do presídio.
Uma vez por mês, a atividade - em parceria com prefeituras, apoiada pela Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) - acontece em um ginásio da cidade. A saída temporária da unidade é momento de reflexão. Preso por homicídio, Anderson Jorge Galindo, 31, não desviava o olhar pela janela do ônibus durante os dez minutos de percurso até a quadra.
"A sensação é de liberdade. A vontade é de estar trabalhando, mas temos que pagar pelo que fizemos", ressalta o detento, que deixou o local pela primeira vez em oito meses.
Seleção. O treinamento fora do presídio é uma espécie de prêmio para presos com bom comportamento. Na última quarta-feira, 13 deles, a maioria envolvida com o tráfico de drogas, deixaram a unidade. A pré-lista fica a cargo de Brazolin, que dá preferência a potenciais jogadores. Mas o aval é da psicóloga e da direção do presídio que, para evitar possíveis estratégias de fuga, só avisa os presidiários minutos antes da saída.
"A atividade diminui o ócio e proporciona uma nova oportunidade", destaca o diretor do presídio, Carlos Henrique Martins. Inaugurado há um ano e cinco meses, o presídio de Itajubá é considerado modelo no país.
Já na quadra, os detentos parecem crianças com a bola na mão. Antes, porém, um instante de oração. Aquecimento e, enfim, bola ao cesto e um coletivo exigente. "Olha o ladrão!", grita um, brincando com os demais presidiários.
"Isso é o que faz a distração para os presos. Sai um pouco daquele ambiente fechado, de terror e faz com que a gente tenha mais vontade de praticar esporte, influencia a gente a ter um objetivo maior na vida, a não ser o crime", afirma Tiago Medeiros, 27, que cumpre pena por tráfico de drogas e assalto.
Durante a atividade, os presos são vigiados pelos agentes penitenciários. A presença de parentes não é permitida. Além de Itajubá e São Lourenço, o Instituto Brazolin realiza o trabalho de ressocialização de detentos em Caxambu e Pouso Alegre, no Sul de Minas, e em Volta Redonda, no Rio de Janeiro.
Analogias
Ala. É o rato, aquele que tem mão rápida, corredor, velocista. No basquete, é aquele que arremessa, faz bandeja, o "cestinha", pontuador. No mundo do crime, é o praticante de furto, o popular, ladrão de galinha.
Armador. No crime, é o traficante, o ladrão de banco. Tem visão periférica. É o organizador, o estrategista. No esporte, tem o papel de disciplinador, prega o companheirismo e promove a união do grupo.
Pivô. É o forte, bom de briga. Em ações criminosas, é aquele que dirige o carro em fuga. O pivô não tem medo de nada, um franco-atirador, um camicase. Em quadra, é o reboteiro, protege o garrafão, um jogador que se mata pelo time.
Ajuda
Colaboradores. O Instituto Brazolin precisa de parceiros para manter os trabalhos sociais. Os interessados podem fazer contato pelo email: institutobrazolin@yahoo.com.br
O que seria apenas uma atividade de ressocialização em presídios pode virar um celeiro de grandes craques. O ala-pivô Diogão, 27, é um exemplo. A dois meses de deixar a prisão, o jogador treina forte e já sonha com um time profissional.
Na última quarta-feira, Diogão recebeu a notícia de que foi convocado para a seleção de Itajubá, que disputa os Jogos do Interior de Minas Gerais (Jimi).
"Acho que tenho condições de jogar. E, desta vez, vou achar uma maneira honesta de levar a vida", avisa o detento, que cumpre pena por assalto.
O jogador de 1,90m quer seguir o exemplo de um outro colega, que deixou a prisão para jogar em um time da segunda divisão de basquete no interior do Estado de São Paulo.
As "peneiradas" de Brazolin são elogiadas também fora de Minas Gerais. "De fato, o Brazolin é um ser humano diferenciado e abraça esse trabalho com muito afinco, mudando as perspectivas destas pessoas", expressa o prefeito de Volta Redonda (RJ), Antônio Francisco Neto.
Mão de obra. Em Itajubá, a administração municipal conseguiu minimizar o preconceito da população com a inauguração do presídio na cidade colocando os presos para trabalhar. Hoje, eles atuam em várias obras da prefeitura.
O recurso desembolsado pela prefeitura é bem menor do que o pagamento de um funcionário. "O dinheiro é dividido entre a família do detento, o Estado e uma poupança para ele", explica o prefeito Jorge Renó. (TN)
Recuperados
10 presos
de 12 do 1º time de Brazolin não voltaram para a prisão
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